segunda-feira, 5 de maio de 2008

O meu percurso...

Tenho de admitir que a possibilidade de trabalhar no estrangeiro não tombou do mero acaso. Surgiu no dia em que tomei consciência da situação actual do nosso sistema de ensino. Isso foi pouco depois de iniciar a licenciatura, contudo na altura pensei que esse contratempo era pequeno no meio de um desafio que sempre vivi e que me via a viver para sempre, o de ser professora. Com o meu objectivo bem traçado, encarei esta possibilidade como a única no plano do razoável.

Foi com alguma frustração que alimentei esta possibilidade porque o meu objectivo é ser professora em Portugal, mas assim foi. Após ter terminado a licenciatura, comecei a enviar currículos para agências de recrutamento de profissionais em ensino em Inglaterra e parti à aventura.

Estou neste momento colocada numa escola como Teacher Assistant no Departamento de Ciências. Como estou igualmente ligada ao SEN (Special Education Needs), a minha função na escola não só é ajudar os professores no desenrolar das aulas, mas também dar apoio mais individualizado a determinadas crianças com algumas necessidades especiais. Noutras condições as necessidades poderiam estar aliadas a deficiências motoras ou mentais, no meu caso específico apenas têm a ver com dificuldades de aprendizagem ou comportamento (posso garantir que não é fácil também).

A primeira fase após a minha chegada a Londres, a 2 de Outubro de 2007 foi um pouco complicada. Estive algum tempo enrolada em burocracias com agências e escolas á espera de respostas. O processo de “legalização” não é fácil, e viver neste país sem sustento também não. Tratar do National Insure Number, traduções de documentos, cartas de recomendação, CRB… tudo isto requer tempo e muita paciência. Viver sozinha pela primeira e envolta de chatices muitas vezes puxou-me para baixo contudo, tudo se resolveu tal como eu inicialmente tinha traçado. Após algumas colocações provisórias a preencher covers noutras escolas, fui finalmente colocada permanentemente até ao final do ano lectivo na Charles Edward Brook Girl´s School em Oval (Londres).

Não é fácil entrar numa escola a meio do ano lectivo porque a recepção nem sempre é calorosa. As crianças por vezes são bastante maldosas e reagem na defensiva, como não conhecem, atacam. Foi preciso algum tempo de adaptação e paciência para me ver moldada não só a um paradigma diferente como também a problemas intrínsecos. Quem diz que existe violência nas escolas portuguesas, tem de viver a realidade inglesa para sentir o que são problemas profundos a nível do comportamento. A experiência na escola onde estou colocada levou-me a descobrir a resposta á questão “porque será que existem tantas vagas para professores cá?” Porque ser professor em Inglaterra não é fácil, os alunos não nos respeitam nem compreendem o fundamente base da educação. Para além de haver graves lacunas em termos de regulamentação, um currículo moldado em utopias também não ajuda. Para mim, o grande problema recai sobre a progressão, eu lido com muitas jovens de 15 anos com capacidades cognitivas de 8. É complicado lidar com o complexo quando o básico não existe e é obvio que isso se vai reflectir também a níveis de educação cívica básica. Mas acredito que isto é apenas a minha experiência recente. Não aponto o dedo a todas as escolas, mas verdade é que se eu vim para este país cheia de idealismos em encontrar o sucesso, esses idealismos depressa se esbateram.

Contudo, e aparte de filosofias, hoje em dia sinto-me bastante satisfeita com o trabalho que tenho vindo a desempenhar, para além de ter conquistado um generoso leque de alunas, que apreciam a ajuda que lhes dou, também sinto que o departamento está satisfeito. O trabalho não é exaustivo, a minha função recai mais sobre a performance da sala de aula, mas é contudo, bastante gratificante.

Já lá vão 7 meses desde que cheguei a terras de “Sua Majestade” e a introspecção é positiva. Para além de estar empregada estou a viver ainda um sentimento de estudante porque estou em formação, a aprender novos modelos de aprendizagem novas ideologias que em muito têm ajudado a construir um contentamento pessoal. Espero para o ano estar colocada numa universidade a fazer o PGCE para daqui a dois anos estar colocada como professora numa escola em Inglaterra. Com isto reuni muitas aprendizagens, muitos recursos (nisso o modelo é extraordinário) um currículo razoável para nos anos seguintes tentar instituições particulares no meu grandioso e adorado Portugal.

...com saudades da familia, dos amigos, das noites e dos dias.

4 comentários:

Henrique disse...

Com saudades :)

Capitão disse...

Olá Joana.

Infelizmente no nosso país todos os dias encontramos situações como a tua. São alunos de medicina que vão estudar para fora, quando em Portugal não há médicos, e vamos buscá-los a outros países. São os professores que não têm vaga, quando o ensino público está como está.

Fico triste por ver-te ir para longe dos teus amigos, da tua família para encontrares trabalho. Espero que um dia possas voltar e reconheçam o teu valor.

Ainda hoje fiquei a saber que um alto quadro do Banco de Portugal foi promovido por mérito, quando esteve de licença sem vencimento nos últimos 8 anos. É este contraste que choca as pessoas e que descredibilizam o sistema.

Enfim é um escândalo!

P.S. Continua a escreve e boa sorte com o blog

Joana Alves disse...

Um escândalo, tenho de concordar!!
Enfim, parece que há coisas boas e coisas más por todo o lado. Mas sabes que foi preciso sair do meu país para o descobrir. Foi preciso ver outras realidades para perceber que a nossa está coberta de coisas boas e bem-feitas, de valores, de cultura, de tanto de tão belo. Somos um país de topo na cauda da Europa. Não deixa de ser triste, mas não é por isso que deixamos de ter valor próprio.
A verdade é que hoje enche-me a alma o orgulho de pertencer a esta pequena massa chamada Portugal. Claro que fico triste por saber que este meu trajecto não foi opcional, mas isso não me faz apontar o dedo. Esta é uma realidade onde a culpa é de todos e não é de ninguém. É o mercado sobrelotado e contra isto não há muito a fazer. E depois, o sentimento de frustração desvanece-se porque abraça a saudade e a certeza de saber que é aí que me encontro.
Por muito pequenos que sejamos e por muitos escândalos que encontremos, a realidade é sempre pintada por meras conjunturas. É a vida!!

Joana Alves disse...

ahhh é verdade!! E fica a publicidade feita: http://istoeumescandalo.blogspot.com/

Obrigado Calado =))